quarta-feira, 15 de novembro de 2006

Líbano: "Guerra-quente"?

ESTE ARTIGO DE OPINIÃO SAIU NO JORNAL QUOTIDIANO DE PONTA DELGADA, DIÁRIO DOS AÇORES, NO PASSADO DIA 2006.09.03

Neste verão, entraram, pelas nossas casas, imagens, em directo, de uma guerra, no mediterrâneo oriental. Será que foi só uma resposta ao aprisionamento de dois soldados israelitas? Não, esta foi somente a causa precipitante. Então, dissequemos como tudo surgiu.
Em 2003, o Irão ofereceu-se para negociar todas as questões pendentes com os EUA, incluindo a questão nuclear e uma solução para o conflito Israelo-Palestiano. A oferta foi feita pelo moderado governo de Khatami com o apoio do "supremo líder", linha dura do Ayatollah Khamenei. A resposta da administração Bush, como já se devia prever, foi censurar o diplomata suíço que transmitiu a oferta.
Em Junho de 2006, o Ayatollah Khamenei emitiu uma declaração oficial afirmando que o Irão concordava com os países árabes sobre a questão da Palestina, o que significava a aceitação do apelo de 2002, da Liga Árabe, para a plena normalização de relações com Israel num acordo dos dois estados com o consenso internacional. A OLP, naturalmente, apoiou oficialmente uma solução destes dois países durante muitos anos, e apoiou a proposta de 2002 da Liga Árabe. Até o Hamas indicou a sua disposição de negociar este acordo.
Todavia, os EUA e Israel continuam a não assumir como real os avanços dos países árabes. Nunca quiseram perceber que o Irão parecia ser o único país a ter aceite a proposta do director da AIEA, de que todas os materiais fósseis utilizáveis em armas fossem colocados sob controle internacional, um passo rumo a um Tratado de Eliminação de Materiais Fósseis (Fissile Materials Cutoff Treaty, FMCT) verificável. A proposta de ElBaradei, se fosse aplicada não só finalizaria a crise nuclear iraniana, como também, trataria de uma crise muitíssimo mais séria. A crescente ameaça de guerra nuclear levou a que eminentes analistas e politólogos advertissem do apocalipse que estava para acontecer em breve se as políticas continuarem naquele curso.
Ainda assim, os EUA continuavam a opor-se, fortemente, ao FMCT verificável, mesmo assim apesar do querer americano, o tratado foi a votos na Nações Unidas, onde foi aprovado com 147 votos contra 1, com duas abstenções: Israel, porque não se podia opor ao seu patrão, e mais curiosamente a Inglaterra de Blair, à qual detém um grau de soberania. Mais uma vez se percebe que as Nações Unidas têm que ser reformuladas, sob pena de continuarem a serem completamente marginalizadas no mosaico das Relações Internacionais.
Depois de ter feito um percurso histórico para contextualizar, agora pretendo aprofundar este conflito. O sargento Gilad Shalit foi capturado, provocando ondas de consternação por todo o mundo, uma escalada aguda nos ataques israelitas em Gaza, no pressuposto de que a tomada de um soldado é um crime grave pelo qual a população deve ser punida. Em 24 de Julho, forças israelitas raptaram dois civis de Gaza, Osama e Mustafa Muamar, o que, de acordo com todos os critérios, é um crime mais grave do que aprisionamento de um soldado. Os raptores dos Muamar chegaram ao conhecimento dos principais Órgãos de Comunicação Social (OCS) do mundo. Foi relatado, de imediato, na imprensa israelita de língua inglesa, numa nota de imprensa das IDF (Israel Defense Forces). E daí à guerra foi um passo rápido. Durante um mês, cidades foram saqueadas, civis ficaram sem tecto e até sem vida. Depois do cessar-fogo, a meados de Agosto, agora esperamos que quem fez a guerra arranje maneira de restabelecer a paz àquela região tão martirizada ao longo dos séculos. EUA e Israel, assumam a reconstrução. Não continuem a tirar areia aos olhos da opinião pública. Conquistar o Líbano para chegar ao Irão foi um golpe baixo. Conhecem o termo "Diplomacia"?
Concluindo: é extremamente perigoso que, no caldeirão de animosidades a que chamamos Médio Oriente, um país se tenha armado, ostensivamente, com acumulação de armas nucleares, e que inspire outros países a fazerem o mesmo. Pena é que quem morre são sempre os mesmos: os civis. Chamam-lhes "danos colaterais". E eu questiono: se mandassem os filhos dos líderes demagogos, que governam o nosso mundo, para o teatro de batalha, depois veríamos o que seria colateral no meio daquilo tudo... Haja decência!

Sem comentários: