domingo, 26 de outubro de 2008

Que res(caldo)!


ESTE ARTIGO DE OPINIÃO SAIU NO JORNAL QUOTIDIANO DE PONTA DELGADA, DIÁRIO DOS AÇORES, NO PASSADO DIA 2008.10.26

No título desta crónica há um trocadilho: “res” siginfica “coisa” e “caldo”, em italiano, quer dizer “quente”: “Que coisa quente!”. Quero tentar fazer um rescaldo político das últimas eleições à Assembleia Legislativa Regional dos Açores.
Uma semana depois, o que muda? NADA! Os Açores continuam cor-de-rosa. Todo o mundo a viver no vermelho (economicamente) e cinzento (politica e socialmente) e, aqui nos Açores, tudo está bem! Será?
A minha primeiríssima palavra vai para os abstencionistas. Das eleições de 2004 para 2008, o número de recenciados, nos Açores, aumentou em 1,02%, ou seja, mais pessoas a votar. Todavia, a abstenção, em igual período aumentou em 8,9%! Ou seja, 102.735 açorianos recenciados (53,24%) preferiram alhear-se da política, da condução pública das suas vidas. Porque será? Quem fizer uma análise sociológica terá um rol de razões para justificar tal hecatombe democrática. Vou, no exercício das minhas competências, somente, referir que talvez a solução para este problema esteja na concertação inter-partidária para que se democratize o direito ao voto dos jovens, não dificultando o direito ao voto quando estes, por razões de estudo ou outras, não se encontrem perto da sua mesa de voto, no dia das eleições. A Região Autónoma dos Açores é a região mais jovem do país. Tem que haver mais atenção ao voto dos jovens. Muitos jovens ainda nem recenciados estão. Convido os deputados recém-eleitos a, no mais curto espaço de tempo desejável, regulamentar sobre esta temática.
O atenuar da abstenção, a meu ver, passaria, também, pelos candidatos, à praxis política, terem maior respeito pelos cidadãos, poupando-os a propostas demagógicas e a promessas utópicas. Há um divórcio evidente entre o povo e os seus governantes muito por culpa disso mesmo. E muito mais haveria a dizer…
Um dos vencedores da noite são, inquestionavelmente, Carlos César e o Partido Socialista Açores, que já vão na quarta vitória consecutiva. Venceram do “Corvo a Santa Maria”, obtendo 49,96% das intenções de voto. Todavia, e analisando as estatísticas de 2004 para agora, perderam 15.063 votos (7%). Explicações? Carlos César e o PS tê-las-ão!
Outro vencedor da noite é a democracia plural e representativa. Zuraida Soares e o Bloco de Esquerda, pela primeira vez, vão poder dar voz às suas bandeiras. O PCP volta à Assembleia e o CDS-PP vê aumentado o seu elenco parlamentar. Até na mais pequena ilha açoriana, o Partido Popular Monárquico consegue a eleição do seu líder.
E quem perdeu estas eleições? O PDA, que não consegue colocar um único deputado, como era seu ensejo; o MPT que, apesar da estupenda e clarificadora campanha eleitoral, também não consegue pôr um deputado (estas duas forças partidárias até duplicaram os seus votos). Mas o grande derrotado foi o PPD/PSD. Não foi só Carlos Costa Neves. Foi toda a estrutura regional, conselhia e local do partido. Carlos Costa Neves, na minha opinião, até muito fez. Mas como quem perde, tem que deixar lugar para quem quer ganhar no futuro, demitiu-se num gesto nobre. Não prevejo tempos calmos para os lados do “laranjal”. Para os próximos tempos, teremos eleições ao Parlamento Europeu em Junho próximo; à Assembleia da República e Autárquicas no principio do Outono de 2009.
(Fonte: http://www.eleicoes2008.azores.gov.pt/ )
Concluindo: Carlos César, aproveite o seu último mandato. Enquanto os fundos comunitários continuarem a encher os cofres da Região, tudo estará bem. Quando terminarem é que vão ser elas!

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Vamos Votar

ESTE ARTIGO DE OPINIÃO SAIU NO JORNAL QUOTIDIANO DE PONTA DELGADA, DIÁRIO DOS AÇORES, NO PASSADO DIA 2008.10.20


Artigo 10º
(Sufrágio universal e partidos políticos)



O povo exerce o poder político através do sufrágio universal, igual, directo, secreto e periódico, do referendo e das demais formas previstas na Constituição.

Os partidos políticos concorrem para a organização e para a expressão da vontade popular, no respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade do Estado e da democracia política.[1]


Este artigo da Constituição Portuguesa espelha bem o que hoje quero tratar: direito de voto. Hoje, quando estamos a eleger os nossos deputados à Assembleia Legislativa Regional dos Açores, quero sistematizar, mais uma vez, este conceito. Para tal, é premente contextualizá-lo à luz das teorias da Ciência Política. Assim sendo, tem que se introduzir o conceito de participação política, como sendo “(...) o conjunto de actos e de atitudes que aspiram a influenciar de forma mais ou menos directa e mais ou mais legal as decisões dos detentores do poder no sistema político ou em organizações políticas particulares, bem como a própria escolha daqueles, com o propósito de manter ou modificar a estrutura (e consequentemente, os valores) do sistema de interesses dominante. (...)” [2].
Com o aparecimento de formas modernas de Estado (Tratado de Vestefália, 1648) no mundo ocidental, e sobretudo com os primeiros impulsos para a democracia interna, pode-se começar a falar de participação política. Na origem da decisão de ampliar o número de participantes nas decisões políticas está o conflito interno entre os diferentes detentores de Poder. Os processos mais transparentes e fáceis de estudar e de comparar dizem respeito à expressão da problemática da participação política, sob a forma de participação eleitoral, isto é, de concessão do direito de voto.
Gianfranco Pasquino, no excerto acima transcrito, realça dois dos muitos problemas importantes do panorama político mundial: a conquista do voto e as fraudes dos políticos. Não é somente em Portugal como também nos Estados Unidos e noutros países do “suposto” mundo desenvolvido que acontece isto. Neste contexto deixo uma questão no ar: será que “(...) a consciência de classe promove a participação política, e por sua vez, a participação política aumenta a consciência de classe (...)” [3] ou não?
A resposta a esta questão deve ser um desafio à tão almejada globalização. A supressão dos estados a favor duma unidade europeia vai levar a que se perca a unidade estatal de cada país constituinte e à alienação de todos os cidadãos. Um exemplo muito claro é a altíssima abstenção que há sempre nas eleições aqui nos Açores. Costumamos dizer que “aquilo é tudo uma corja de comilões e comem todos do mesmo prato.” Penso que, com o andar das coisas, temos que, duma vez por todas, assumir os nossos compromissos sociais e cívicos, para mais tarde não nos queixarmos que “eles sempre decidem tudo”. Se “eles” fazem isto é porque nós o consentimos.


(Fonte: MAURÍCIO, Miguel, Votar ou não votar? Eis a questão. Adaptado dum artigo escrito a 2003.03.20, neste quotidiano Diário dos Açores)


Concluindo: não vamos destruir o que muitos lutaram para conseguir - a Democracia, e por conseguinte, a possibilidade de eleger os nossos legítimos representantes no exercício do Poder seja ele local, nacional e mesmo internacional. Há que assumir responsabilidades.


[1] CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa, Lei do Tribunal Constitucional, 2002, Coimbra, Coimbra Editora, 6ª edição, p. 14
[2] PASQUINO, G, Curso de Ciência Política, 2002, Cascais, Principia, Publicações Universitárias e Científicas, 1ª edição, p. 50
[3] PIZZORNO, A., “Introduzione allo Studio della Partecipazione Politica” in Quaderni di Sociologia , 15, 1966, pp. 235-287

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

7 Dias…

ESTE ARTIGO DE OPINIÃO SAIU NO JORNAL QUOTIDIANO DE PONTA DELGADA, DIÁRIO DOS AÇORES, NO PASSADO DIA 2008.10.12
A uma semana das eleições para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, hoje oferece-me sistematizar Direito ao Voto. Proponho, antes de mais, a leitura atenta da Secção I (do Título II, do Capítulo I) do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (Lei n.º 9/87 de 26 de Março, alterada pela Lei n.º 61/98 de 27 de Agosto):
“(…) TÍTULO II
Órgãos regionais
CAPÍTULO I
Assembleia Legislativa Regional
SECÇÃO I
Estatuto e eleições
Artigo 11º.
Definição
A Assembleia Legislativa Regional é o órgão representativo e legislativo da Região e fiscalizador da acção governativa.
Artigo 12º.
Composição
A Assembleia Legislativa Regional é composta por Deputados, eleitos mediante sufrágio universal, directo e secreto, de harmonia com o princípio da representação proporcional e por círculos eleitorais.
Artigo 13º.
Círculos eleitorais
1. Cada ilha constitui um círculo eleitoral, designado pelo respectivo nome.
2. Cada círculo elegerá dois Deputados e mais um por cada 6000 eleitores recenseados ou fracção superior a 1000.
3. Haverá ainda mais dois círculos, um compreendendo os açorianos residentes noutras parcelas do território português e outro os açorianos residentes no estrangeiro, cada um dos quais elegerá um Deputado.
Artigo 14º.
Eleitores
1. São eleitores nos círculos referidos no nº. 1 do artigo anterior os cidadãos portugueses inscritos no recenseamento eleitoral da respectiva área.
2. São eleitores nos círculos referidos no nº. 3 do artigo anterior os cidadãos portugueses residentes na área desses círculos e que tenham nascido no território da Região.
Artigo 15º.
Condições de elegibilidade
São elegíveis os cidadãos portugueses eleitores, salvo as restrições que a lei estabelecer.
Artigo 16º.
Incapacidades eleitorais
As incapacidades eleitorais, activas e passivas, são as que constarem da lei geral.
Artigo 17º.
Mandatos - Dissolução da Assembleia
1. Os Deputados são eleitos para um mandato de quatro anos.
2. Em caso de dissolução da Assembleia Legislativa Regional, as eleições terão lugar no prazo máximo de 60 dias.
Artigo 18º.
Candidaturas
1. Os Deputados são eleitos por listas apresentadas pelos partidos políticos, isoladamente ou em coligação, concorrentes em cada circulo eleitoral e contendo um número de candidatos efectivos igual ao dos mandatos atribuídos ao respectivo circulo, além de suplentes em número não superior a cinco.
2. As listas podem integrar cidadãos não inscritos nos respectivos partidos.
3. Ninguém pode ser candidato por mais de um círculo eleitoral ou figurar em mais de uma lista.
4. No apuramento dos resultados aplicar-se-á, dentro de cada círculo, o sistema de representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt.
5. Os mandatos que couberem a cada lista serão conferidos aos respectivos candidatos pela ordem de precedência indicada na declaração de candidatura.
Artigo 19º.
Preenchimento de vagas
1. O preenchimento das vagas que ocorrerem na Assembleia Legislativa Regional, bem como a substituição temporária de Deputados, serão assegurados, segundo a ordem de precedência referida no nº. 5 do artigo anterior, pelos candidatos não eleitos na respectiva lista.
2. Se na lista já não houver mais candidatos, não terá lugar o preenchimento da vaga ou a substituição.
Artigo 20º.
Início da legislatura
1. A Assembleia Legislativa Regional reúne, por direito próprio, no 15º. dia após o apuramento dos resultados eleitorais.
2. A Assembleia verificará os poderes dos seus membros e elegerá a sua mesa. (…)”

Depois da leitura atenta, questiono: Porque é que os meus concidadãos, em vez de andarem sempre a praguejar contra a praxis política e os políticos (que se servem), não vão exercer o seu exercício cívico? Votar é dizer que se quer um em detrimento de todos os outros. Quem não votar, democraticamente, não terá “boca de abrir”.
Nunca como nos nossos dias se falou tanto de liberdades, direitos e garantias. Todavia, estes conceitos pressupõem, antes de mais, um conjunto de prerrogativas essenciais à prossecução do serviço à cidadania. Não deve haver direitos sem deveres, nem liberdades sem respeito pelo espaço do próximo. O voto é um acto relativamente simples. Esta afirmação não deve, porém, fazer-nos esquecer que a extensão do sufrágio foi produto de grandes lutas entre os detentores do poder político e os provocadores, no interior da classe dominante e no seu exterior; que o processo de democratização eleitoral e a criação de estruturas partidárias e institucionais adequadas para sustentar o peso da participação eleitoral decorreram a ritmos e cedências diversos; que nos mais diversos países o direito de voto nunca é conseguido nem assegurado de uma vez por todas, sendo frequentemente revogado, o seu exercício submetido a abusos e prepotências, a sua tradução em mandatos manipulada com fraudes e falcatruas. Obviamente, quando não existe uma tutela eficaz da participação eleitoral todas as outras formas de participação política institucionalizada, pacífica e legal se tornam um tanto difíceis e precárias. Votar é um dever de cada cidadão interessado em ser bem governado. Não votar é passar um cheque em branco. É permitir que as coisas fiquem tal qual elas estão.
(Fonte:
http://www.alra.pt/estat.pdf )
Concluindo: No próximo Domingo não fique em casa. Desloque-se até à sua Mesa de Voto e exerça, em consciência, a sua cidadania. O futuro começa aqui: na nossa decisão, na nossa determinação. Como dizia Sá Carneiro: “A política sem risco é uma chatice mas sem ética é uma vergonha”.

domingo, 5 de outubro de 2008

“Caldeirada” alla Bolognesa! (III)

ESTE ARTIGO DE OPINIÃO SAIU NO JORNAL QUOTIDIANO DE PONTA DELGADA, DIÁRIO DOS AÇORES, NO PASSADO DIA 2008.10.05



Se é verdade que as escolas tiveram que fazer uma estimativa de carga de trabalho por cada unidade curricular, é também verdade que estão agora em condições de as corrigir, calculando os ECTS com base em inquéritos a estudantes. Se é compreensível que a prioridade das escolas tenha sido a adequação formal dos cursos ao Processo de Bolonha (PdB), também é verdade que chegou a altura de fazer com os estudantes, Conselhos Pedagógicos e com os parceiros sociais uma reflexão acerca dos objectivos dos cursos, as saídas profissionais e os métodos de ensino e de avaliação mais adequados.
É igualmente urgente que os Governos, Autarquias e instituições se empenhem em aumentar exponencialmente os níveis de mobilidade estudantil (dos nacionais e dos estrangeiros), uma vez que a mobilidade tem efeitos positivos estudados e reconhecidos no acesso a emprego por parte dos diplomados, na sua abertura de espírito e competência e na criação de sociedades mais modernas, tolerantes e intelectuais. Também a presença de alunos estrangeiros no campus favorece a aquisição das mesmas competências pelos alunos nacionais. Mas ao observarmos que apenas 5% dos alunos são móveis por um semestre que seja e que eles provêm dos sectores mais favorecidos das sociedades europeias, percebe-se como estamos longe de fazer deste instrumento um factor de mudança do ensino superior e de criação de uma verdadeira sociedade europeia.
É por isso mesmo que os estudantes têm apontado o dedo às políticas de Ensino Superior que negligenciam o desenvolvimento da dimensão social como um factor estruturante para a qualidade do sistema de Ensino Superior e para a promoção da equidade social. Em muitos países europeus, está-se a observar um crescente constrangimento financeiro das instituições, a introdução e aumento de propinas, a cobrança de emolumentos e a introdução de empréstimos a estudantes como forma de compensação. Se por um lado a criação de formas de autonomização do estudante deve ser apoiado, por outro lado devemos preocuparmo-nos com o nível de endividamento estudantil que existe em países com o mesmo sistema e com aparente substituição do reforço a acção social pela introdução destes sistemas. A prioridade das políticas pelo sector deveria ser o uso da capacidade construída no Ensino Superior e o reforço dos incentivos (bolsas, apoios sociais, benefícios fiscais) para abrir as portas do ensino superior a sectores sociais continuamente deixados nas suas margens.



(Fonte: CARAPINHA, Bruno, Comité do Processo da European Students’ Union)



Concluindo: Os Ministros europeus fizeram do desenvolvimento da acção social uma das prioridades para o PdB no período até 2010. Não será tempo de os estudantes nacionais pararem de reclamar contra um processo que é a esta altura irreversível e cuja correcta implementação lhes pode trazer inúmeros benefícios e passarem a usá-los como espaço e fonte de legitimidade para as suas justas reivindicações? Afinal de contas, a promessa de não aumentar propinas era só para esta legislatura e as próximas eleições à Assembleia da República são já em 2009.